sexta-feira, 23 de maio de 2014

Contos do Amante da Morte [Semana 09]

Autora: Mari-Youko-Sama
Capítulo 08 – Ressentimentos passados.

Depois do inverno gélido que parecia durar uma eternidade, a primavera finalmente irrompeu a neblina pálida, as amendoeiras se enchiam de folhas verdes e flores campestres brotavam em qualquer canto em que o sol tocasse; abelhas zuniam por todos os lados e rouxinóis cantarolavam embalando as manhãs. Se não fossem as más notícias vindas do norte, a vida naquela região poderia ter se recuperado.

Marcos seguia com seu lince, ambos com passos ligeiros e leves, o animal sempre atento e curioso. Não demorou muito pelas estradas até que avistou o templo onde Matheus se instalou, uma das poucas construções feitas em pedra e argila da região, parte com uma coberta feita de madeira e palha e outra parte a céu aberto. Um investimento de um dos grandes senhores da região, que diziam ter sido o único a não ter sua casa invadida pela peste no inverno. O que Marcos bem sabia que era simples fofoca, não havia uma casa naquelas terras que não tivesse sido marcada pela doença.

Várias pessoas se amontoavam na entrada do local, algumas ajoelhadas, outras completamente jogadas ao chão entoando mantras e fazendo oferendas. Marcos avistou seu irmão que aconselhava uma senhora provavelmente camponesa. Logo fizeram contato visual, Matheus lançou um olhar questionador e Marcos lhe respondeu com um meneio de cabeça, o mais novo suspirou e sorriu para senhora magra que se levantou e caminhou triste para fora do templo. Matheus fez um aceno com a mão e o maior se aproximou:

– Veio pedir conselhos e bênçãos, meu irmão? – Matheus estendeu a mão para o lince que logo se aproximou e ronronou em resposta ao afago em suas orelhas.

– Sim e não. – o tom era vago, o mais alto tinha um semblante preocupado. – O boato do outro dia sobre Ele

– Não era um boato. – Interrompeu – ele está morto e sua prole também, ou seja, tudo que restou dele somos “nós”, mas… bastardos não têm voz. – o mais jovem cerrou o punho e seu olhar verde era opaco de ressentimento.

– Matheus, escute. – o mais velho repousou a mão sobre o ombro do irmão. – Independente de sermos bastardos ou não, como você mesmo disse, só restou nós dois e temos de cuidar um do outro.

– Meu irmão, caso não tenha percebido, importa sim! – o moreno comentou categoricamente, e retirou a mão do outro de seu ombro. – Se ele tivesse nos reconhecido, agora não estaríamos com uma guerra nas costas! – encarava Marcos diretamente.

– Eu fui chamado. – completou secamente.

– Eu imaginei… – desviou o olhar para o chão. – Não queria que as coisas fossem assim.

– Ninguém quer, mas eu vou voltar, não vou lhe abandonar, Matheus. – o tom de voz foi decidido. – Por isso, me espere e cuide de Lirou enquanto estou fora.

Matheus fez um aceno positivo e logo Marcos seguiu seu caminho de volta a estrada e ao que tinha de enfrentar.

“Os sentimentos humanos são difíceis de medir… o amor, o ódio, mas a cobiça, essa sim é incomensurável”.


Ir para o próximo capítulo de "Contos do Amante da Morte"

Nenhum comentário:

Postar um comentário