sexta-feira, 9 de maio de 2014

Contos do Amante da Morte [Semana 07]

Autora: Mari-Youko-Sama
Capítulo 06 – Labaredas de Inverno.

Naquela época, os dias eram curtos: nasciam tarde e se encerravam logo. A parca luz que atravessava a grossa manta de nuvens tornava a imensidão opaca num lugar cheio de vultos criados por um punhado de neve que dançava ao vento.

Marcos caminhava por entre a vegetação desnuda e vigorosos pinheiros, seu olhar estava distante e escuro, parecia perdido em pensamentos. Em contrapartida, Lirou, o filhote de Lince que já tinha ganhado certo tamanho, seguia atento. Quando uma voz conhecida cortou o ambiente silencioso, Lirou adiantou-se em direção ao som:

– Parece cansado desta vez…

– É difícil manter o ânimo nesse frio – comentou, sem entusiasmo na voz, observando Lirou que rodeava um pinheiro delatando o esconderijo.

– O frio não durará para sempre – enquanto a figura feminina se revelava em um manto branco, seus fios dourados escapavam do capuz, mas seu rosto não era totalmente visível – nos encontramos de novo, então… como devo chamá-lo? – a voz era melodiosa e cheia de mistérios.

– Blackwood, Marcos Blackwood. E o lince é Lirou – o olhar continuava distante.

– Marcos e Lirou, interessante – a mulher formou um sorriso em seus lábios finos – sou Apony – fez uma reverência, abaixando sutilmente a cabeça.

Apony de borboleta? Deveria parar de usar esses perfumes, no inverno não há flores, é apenas gélido e mórbido. – o peso na voz era evidente.

– As borboletas são sinais do início da primavera – a estranha se aproximou e estendeu a mão até o queixo de Marcos, tocando-lhe a barba sutilmente – Nós levamos os maus augúrios do inverno, para deixar o fardo dos que sobreviveram ao frio mais leves para o próximo ciclo.

Marcos a encarou por entre os fios loiros e pôde comprovar que os olhos daquela mulher eram realmente dourados, como peças de ouro polidas e reluzentes que pareciam varrer-lhe a alma em busca dos sentimentos mais sombrios. Ele caminhou um passo à frente e repousou a cabeça na curva do ombro daquela estranha, as lágrimas irromperam e molharam o manto branco. Apony enlaçou o pescoço do outro com seus braços e lhe sussurrou ao ouvido: “Queime a casa, liberte-os e seja livre também”.

***

Mais tarde naquele mesmo dia, Marcos e Matheus estavam em frente ao casebre onde viveram com o pai, a mãe e os irmãos, que naquele momento era como um grilhão feito de sentimentos e memórias. O mais velho segurava a tocha em punho, quando encarou o mais novo, este lhe respondeu com um aceno positivo. Logo mais, o casebre era envolto em chamas altas e logo alguns aldeões foram atraídos pela cremação, pois onde havia uma fogueira, havia notícias de mortos pela peste. Marcos trocou palavras com os mesmos, mas seu rosto empalideceu ao ouvir “as boas novas”:

– Qual o problema meu irmão? – Matheus adiantou-se.

– Morreram.

– Quem?

– Nosso irmão e… “ele”.

“Ele” – escondeu a boca com a mão – … morto!?

“Eu posso afirmar que todos temem a escuridão. Se permitem fazer o errado e começam a amar o pecado… ao ponto da dor alheia satisfazer a sua dor”


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