sexta-feira, 4 de abril de 2014

Contos do Amante da Morte [Semana 02]

Autora: Mari-Youko-Sama
Capítulo 01 – Dias de Outono.

Naquela manhã clara e fria, as planícies rubras faziam jus ao nome, tingindo a paisagem em tons escarlate em contraste à respiração pálida esbranquiçada que flutuava no ar.

A movimentação no vilarejo era ativa, os aldeões levavam seus animais para pastar, enquanto eram comercializadas frutas da estação recém-tiradas. Um jovem de cabelos acobreados nos seus vinte anos pausava com um punhado de madeira ao lado de um modesto casebre, fincou o machado num toco e adentrou o local:

– Estou de volta... – com evidente cansaço na voz.

Não houve resposta e era possível ouvir murmúrios em outro cômodo. O rapaz se esgueirou pela casa em passos felinos e se aproximou da área da cozinha, fintando duas crianças abaixadas conversando secretamente em frente a um cesto emborcado. O maior ainda pode ouvir:

– O que fazemos com ele mana? – o menor, em seus seis anos, questionava com seus cabelos arrepiados.

– Não sei, mas o mano não pode saber! – comentou a maior, com seus dez anos, seus cabelos encaracolados castanhos cobriam-lhe as costas

– Parecem estar se divertindo, não é? Marcela? Miguel? – o tom do maior foi audível, os menores titubearam e caíram de bunda no chão, os olhos arregalados e a expressão de susto estampada:

– Mano! Já em casa? Tão cedo! – o tom falso de quem não sabia mentir tomou a voz de Marcela.

– Foi ideia da mana! – dedurou o menor, apontando para irmã.

– Meahw! – um quarto som foi ouvido.

O maior finalmente se abaixou, levantando o cesto, revelando uma figura felina de pelo amarelo acinzentado, grandes orelhas felpudas e sem cauda. Logo a menina se pôs a justificar:

– Ele estava sujo e com fome, eu não ia deixá-lo lá, sozinho! – tomou-lhe nos braços, protegendo-o como se fosse seu filhote.

O maior coçou a cabeça, estava em uma situação difícil, os olhos de seus irmãos menores não fugiam de sua expressão esperando uma resposta positiva. Quando uma quarta voz se juntou à conversa:

– É um lince das montanhas. Os aldeões mataram um por esses dias que estava comendo galinhas. – um jovem de seus quinze anos, com cabelos escuros e olhos esverdeados cortou a cozinha, se aproximando do animal.


– Eu sei, eu fiquei sabendo. – retrucou o irmão maior, agora parecia ser um voto vencido no assunto.

– Podemos ficar com ele? – perguntou a menina com os olhos brilhantes. – Ele perdeu a mãe, assim como nós, mas ele não tem irmãos pra cuidar dele. – a voz era triste.

– Tudo bem, tudo bem. – suspirou resignado. – Vamos cuidar dele, mas terão de alimentá-lo, ele não vai tomar leite toda vida, então terão de ensinar-lhe a caçar, sem ser as galinhas dos aldeões. – levantando-se finalmente e fazendo um afago nos dois irmãos. Em seguida os menores saíram para brincar com o pequeno felino.

– Mas até você acobertando essas peraltices, Matheus? – questionou para o irmão do meio.

“Os abandonados” têm de se cuidar não é? – o tom foi distante. E o silêncio instaurou-se naquela pequena cozinha.


“Não sou digno de elogios, apenas um ser desesperado agarrando-se àquilo que restou...”.


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